segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Ela

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Ela não entendia. Não entendia mais. A fórmula de um caso de uma noite deixou de fazer sentido. O investir. Investir tempo, dinheiro e combustível em algo sem futuro. Em alguém que não voltaria a falar com ela depois de um momento mais íntimo. Alguém que não voltaria a mandar mensagem. Alguém que não quereria mais saber dela.
Ela deixou de entender. Deixou de o querer. Umas horas para a fazer esquecer-se de quem era deixaram de ser suficientes. Tal como ela sentia que não era suficiente. Ela sempre tivera este mal: não querer quem a queria, mas querer quem a não queria.
E lá voltava ela à praia. Vezes sem conta, fossem que horas fossem. Ver a forma como as ondas continuavam a emergir e a desaparecer, quando tudo o que queria era mergulhar e não voltar à superfície. Submergir no mar em vez de se afogar nos seus pensamentos e sentimentos não correspondidos, pela primeira vez na sua vida.


M.

Espelho embaciado

Fonte: http://thisherelight.com/post/154694931416/the-places-we-go-part-x

Aqueles momentos em que finalmente me sinto seguro para agarrar a minha vida com tudo o que tenho e, de repente, o chão debaixo dos meus pés começa a rachar, como se de vidro se tratasse, e cai caco a caco, com a mesma intensidade com que cai a chuva num dia de janeiro, e eu especado a ver todo o tempo que demorei a chegar até ali, todas as forças e energias que investi para que a minha presença ali se fizesse marcar a desvanecerem, como que o meu rosto num espelho a embaciar. De repente, tudo fica turvo, nada se reconhece, aquele sorriso que me era característico, pelo qual todos me reconheciam começa a desaparecer, e com ele deixo também de conseguir ver a minha alma, que se espelhava nos meus olhos, estes passam a ser nada mais nada menos que duas linhas denegridas no tal espelho embaciado.
Já não sei quem sou, de novo volto à estaca zero. As inseguranças voltaram, e com elas voltaram também o medo e a angústia com que vivia. O chão que outrora parecia estar a rachar ainda aqui está, já não é pedra sólida mas sim vidro frágil. Ainda está inteiro à espera que uma última lágrima negra me caia pela face, para que eu possa cair também com todo o meu caminho, naquele vazio imenso.

F. C.